Benediction – Thurston Moore
Apenas um par de os
olhos castanhos refletia o brilho do sol que agora entreva pelo vidro da janela
semiaberta, onde o vento frio do começo da manhã se espremia e invadia o
quarto, acordando as cortinas, os lençóis e a casa inteira, menos ela que
permanecia conectada ao descansar doce, respirando de leve e suspirando sempre
que expulsava o ar.
Ele não fazia ideia
de quanto tempo ficara ali apenas observando o jeito como ela dormia, só
lembrava que a penumbra da noite ainda os encobria quando o fez, mas tinha mesmo
era medo do que aquilo provocava: ali tão calada e indefesa, protegida pelas
cortinas que do lado dela ainda faziam sombra, ele sentiu uma vontade estranha
de protegê-la de tudo.
Teve de controlar um
riso triste que pretendia cortar a sua garganta quando concluiu que aquele sentimento
estranho e quase solidificado dentro ele era proteção.
Como ele iria protegê-la
e salvá-la, sem ter conseguido salvar sequer a si mesmo?
Havia alguns dias que
ele estava limpo. Não tinham cheirado, nem fumado, nem bebido nada. Quase conseguia
respirar direito e era bom pelo menos uma vez acordar com gosto de hálito, e
não de vomito, no fundo da garganta. O sol não lhe incomodava tanto, nem o
vento, nem nada, exceto ela. Justo ela que deveria ser a única coisa
confortável no meio de tudo.
Mas, ele sabia que
aquilo era apenas passageiro. Sabia que quando o sol voltasse a dormir e o
corpo quente dela não estivesse completamente colado ao dele como agora, ele
voltaria a ser o mesmo drogado que vaga por ruas tão tortas e sujas quanto os
seus pensamentos, suas intenções. Roubar em nome do seu grande e único amor, o
vício, era sua única pretensão, sua grande luta.
A única coisa que ele
tinha certeza naquele momento era de que é precisava deixa-la ir.
O problema é que ele
havia se acostumado com o corpo quente dela, com os afagares dela, com os risos
altos dela, que depois de uma semana ali naquele apartamento imundo, havia se
espalhado de tal modo que era quase impossível juntá-la novamente. Mas, ele
sabia que precisava fazer isso.
Pensou como os pais
dela deveriam estar preocupados imaginando a menina inteligente e linda que
criaram com tanto amor jogada num lugar qualquer, numa cama qualquer com um
vagabundo, em meios às seringas, cervejas e cigarros. Eles tinham razão de
amaldiçoa-lo todos os dias.
Então, a mão dela,
que repousava sobre o peito açudo dele, mexeu-se. Os pés gelados dela procuravam
os dele, igualmente gelados. Então, um olho de cada vez, ela acordou. Parecia
um pouco atordoada ainda do sonho. Deslizou a perna lisa nos pelos grossos da
perna dele. Ele retirou uma mecha que encobria um dos olhos dela e sorriu
terno.
– Há quanto tempo
você está me olhando...? – ela falou rouca, agora com um tanto de rubor nas
bochechas. – Algumas horas. – ele riu observando-a corar mais ainda depois
disso. Ela escondeu o rosto dentro do travesseiro e ele procurou armazenar
todos os detalhes que pudesse sobre ela. Retirou o rosto dela do travesseiro,
puxou-a novamente para o seu peito e fez com que todo o corpo dela colasse ao
dele. Armazenou a sensação. Beijou-a na testa, sentiu o cheiro do cabelo dela. –
Hoje a noite tenho uma surpresa pra você. – e logo ela abriu aquele sorriso
ansioso que ele tanto gostava. – E o que é?! Vamos, me diga! – disse apressada.
– Não, deixe pra noite mesmo. Agora fique aqui quietinha comigo e finja que o
mundo lá fora não existe...
... Antes que ele me roube novamente a
felicidade clandestina, meu anjo, sonhe que em um mundo perfeito nós dois
estamos juntos e que você é meu único amor. E que isso não vai te destruir no
final. Porque nós dois sabemos que vai. E, por mais que doa, esse é o melhor
jeito que conheço de protege-la (de mim e dos meus erros), porque sabemos que esse amor já nasceu condenado.
Admirável esse seu jeito de escrever,de envolver o leitor.Parabéns :]
ResponderExcluirQuisera ser apenas um simples leitor...
ResponderExcluirQue saudade tava daqui, realmente essa Ilzy é uma diva das palavras :)
ResponderExcluirQuantos contos maravilhosos! Amei aqui, amei mesmo. Estou te seguindo! Parabéns pelo trabalho!
ResponderExcluirPercebeu que vc tem escrito um pouco mais poéticamente?! Está uma beleza de conto! Adorei!
ResponderExcluirBeijos enormes e PARABENS!
Muah!
muito mt bom ^^
ResponderExcluirQuando penso que já escolhi meu conto favorito aparece outro melhor ainda! Seus contos são lindos! Parabéns. :D
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