Esse não é o melhor jeito de começar dezembro,
Mas, você sabe que estes defeitos são nossos, falso-imperador.
Pra ouvir: I miss you - Incubus
As roupas amassadas saltavam pelas malas e as garrafas de cerveja ainda com
algum conteúdo se espalhavam pelos cantos do quarto enquanto a luz fraca do sol
lá fora, entre árvores e folhas, se fazia suave e terna, mas não protetora.
Os braços finos de Lorelay abraçavam seus joelhos enquanto ela observava
pela vidraça manchada a vida escondida lá fora, nos campos que também escondiam
aquele casebre herdado do avô e pra onde eles costumavam fugir nesses fins de
semana em que o mundo parece sufocar, misturando-se à vida que também se
escondida ali.
Ambos tinham um alguém que não era outro ali ao lado. Ela costumava
dizer que precisava visitar seus pais na cidadezinha em que nasceu e ele dizia
que tinha um tio doente ou algo assim - era uma família realmente doente
essa dele, ela deveria pensar e Lorelay ria-se disso, mas não por diversão.
Então socavam tudo que estava ao alcance do braço esticado dentro do
guarda-roupa e depois dentro de uma mala surrada pra então ele aparecer de
madrugada na casa dela, jogando tudo dentro do banco de trás e selando seus
lábios com um beijo amargo. Ela encostava a cabeça no vidro gelado do carro
dele e ele colocava a mão no joelho dela. Sorriam pelo prazer da fuga, embora
não estivessem necessariamente felizes.
Acredite: nada disso tem haver com Amor.
Era unicamente desejo. Essa luxuria que possui os corpos que tem uma
vida lá fora, que sabem que não podem destruí-la porque é confortável viver numa ilusão pra sobreviver a nojeira que o mundo é, porém que também não sabem se
ausentar completamente dos seus desejos.
E quando o observava assim, com as pálpebras dele impedindo que o
castanho-medonho (ela gostava de chamar o castanho dos olhos dele assim)
escorresse para ela e uma das pernas dele puxava o pé para caber na altura da
cama que era menor que ele, talvez ela até o amasse.
Mas, segundos depois, lembrava do sorriso dele quando estava certo e
fazia questão de provar isso, ou quando o egocentrismo dele saltava pelas
palavras das suas frases, ou quando ele passava tanto tempo sem ligar que ela
chegava mesmo a pensar que havia acabado e quando ela finalmente estava
conseguindo esquecê-lo, ele ligava na madrugada só pra dizer que queria um colo
e queria o dela.
E ela via a si mesma em todos os defeitos dele.
Talvez fosse mesmo isso que os unisse: já que não havia amor ou algum
sentimento doce, havia compreensão que o outro era mesmo esse
monstro-hipócrita-e-insensível, mas que ali não havia julgamento, não havia
além. Eram somente os dois, vendo um ao outro no reflexo da retina e
despertando o pior do outro, mas de alguma forma o prendendo e controlando.
Recordou, então, a noite anterior, quando ele lhe levantava pelas coxas
e lhe beijava encostada na parede no casebre frio que mal era iluminado pelas
brechas da madeira velha, ardendo de desejo-do-outro, embora os dois soubessem
que na verdade era mais um desejo-de-si. E eles beijavam cada linha um do
outro, mas nunca chegavam à consumação... Sempre parecia demais, parecia que se
fosse até lá, se fundiriam num só coisa da qual os dois temiam. Liga-se por
completo física e mentalmente, e então nunca mais poder se soltar.
Então ele encostava o corpo semi-nu ao dela, agora com o desejo cessado, ali próximo à onde o pescoço dela fazia um curva com o ombro e ela sentia
o suor da testa e do cabelo dele misturando-se ao seu suor, enquanto acariciava o
cabelo dele e ele apertava os braços em sua cintura, e ficavam assim, em
silêncio até adormecerem. Naquele momento até pareciam mesmo amar um ao outro...
Tudo isso era essa relação doentia de falta de amor, de confiança, de
dominação, mas que sobrava desejo. Era essa prisão da qual nem um, nem o outro
podia fugir, embora lutasse e quisesse. Esse amor ao contrário. Esse sufocar
por concessão. Esse encontrar e desejar o outro que tão parecia consigo só por
querer mais de si, embora não pudesse suportar.
- E eu vos declaro amantes até que o amor próprio se restaure.
Eu a-do-rei!!!! Sujo sujo sujo!!!! hahahahaahhaha, beijos Ilzy!
ResponderExcluirIlzy, vc escreve maravilhosamente bem, mas esse texto...
ResponderExcluirA-DO-REI!² como disse a Bruna: sujo.. kkkk
Mas mto cheio de coisas que a maioria tenta esconder e sufocar, e que no fundo não fazem sentido algum... tá, tá... eu sei! me identifiquei demais coom ele.. kkk
Mas está perfeito, simples assim...
Bejitos!
"- E eu vos declaro amantes até que o amor próprio se restaure."
ResponderExcluirAmei, amei, amei. Muito bom o conto Ilzy. Você sabe lidar perfeitamente com as palavras e faz contos tão realistas que as pessoas se identificam. A-M-E-I *--*
é petulância dizer que eu terminei de ler com falta de ar ?! porque você, mais que ninguém, sabe que acabou de publicar aqui a minha alma, o meu coração e todas as suas confissões e impurezas. você sempre arrasa com a minha vida escrevendo assim: por favor, não para nunca. ♥
ResponderExcluirQue texto maravilhoso,sem mais.
ResponderExcluiré bem melhor quando o amor não se restaura. é bem melhor quando a gente é simplesmente aceito pela nossa complexidade... adoreeei!
ResponderExcluirTalvez seja pela idade, mas o conto não me despertou tanto ardor, como nos outros comentários.
ResponderExcluirPosso imaginar seus personagens com mais de 20 anos de casados, cuja paixão se foi, o amor não veio e o desejo de algo inatingível é substituído por carícias picantes.
Ok. Posso ser e estar velho para comentar, mas ainda acho que você deveria arriscar mais no momento "a dois". :)
Tu tem uma boa imaginação para contos, Ilzy.
Beijão
http://www.folhetimonline.com.br
PS: Como não há campo para colocar o nome e o endereço do site, deixei no comentário.
Amo seus textos, sem mais.
ResponderExcluirO que mais é preciso dizer? seus textos são incríveis, e esse não é uma exceção.
ResponderExcluirhttp://saiadeflorbm.blogspot.com
"- E eu vos declaro amantes até que o amor próprio se restaure." Amei!!! *--* Você escreve contos maravilhosos e esse não é exceção. *-*
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